Home / Blog / A vida de Frank Herbert e Duna: As influências de uma obra-prima

Por Bruno Birth* e Pascoal Naib**

Um dos maiores destaques em textos de análise sobre Frank Herbert e seu épico livro de ficção científica Duna, publicado na década de 1960, é a complexidade de uma obra que aborda temas como ecologia, política, filosofia e religião. Com as várias tentativas frustradas de adaptações de Duna para o cinema e televisão, a complexidade de caráter diverso do material fonte sempre foi colocada como uma barreira intransponível para a viabilização plena do entendimento do público, ou seja, Duna passou a ser considerada uma obra de nicho, destinada a não conseguir atingir um grande público. Tal estigma acabou criando obstáculos, receios desnecessários para os muitos que pretendessem conhecer esse universo.

Aqui precisamos citar a Litania do Medo, que dita que “o medo é o assassino da mente”, e que na realidade Duna é um tratado sobre a humanidade, sobre autodescobertas, uma obra de narrativa imprescindível para o século XXI, e até mesmo para reflexões sobre nosso futuro neste mundo.

Isso posto, Duna não é complexo no sentido de inalcançável, ou para apenas poucos “escolhidos” terem o privilégio de entender suas mensagens. O próprio Frank Herbert tinha uma opinião bem interessante sobre seus livros nesse sentido:

“Eu escrevo ficção científica para pessoas que não leem…”

E logo depois acrescentava:

“Existe um acordo não escrito entre você e o leitor. Se alguém entra numa livraria e gasta dinheiro suado (energia) em seu livro, você deve a ela algum entretenimento, tanto quanto possível. Essa sempre foi minha intenção ao longo da vida”.

A primeira edição de Duna

Então, a “complexidade” de Duna está no fato de possibilitar ao leitor encontrar as mais variadas matizes, que são dispostas em camadas narrativas que podem ser experimentadas de uma forma descomprometida e divertida, apenas acompanhando a jornada de um jovem num planeta hostil ou então numa camada mais profunda, na qual o leitor se propõe a perceber nas entrelinhas os diversos questionamentos reflexivos que propiciaram a jornada de Paul Atreides acontecer. Resta ao leitor escolher até onde vai a profundidade da sua Toca do Coelho.

Sendo assim, as cem primeiras páginas de Duna são um desafio à nossa curiosidade, um convite para a descoberta de um outro mundo. Todas as palavras estranhas são propositalmente inseridas para que o leitor seja atraído pelo estranho som que sai de sua boca ao ler termos tais como Gom Jabbar, Kwisatz Haderach, Arrakis…Assim como o jovem personagem Paul Atreides, ficamos confusos, mas fascinados pelos segredos que nos serão revelados. Se trata de uma “desorientação” guiada que impulsiona o leitor a seguir adiante. 

Os vários dilemas da Saga Duna podem ser mais bem compreendidos quando conhecemos um pouco mais da vida real do homem por trás da obra épica. Frank Patrick Herbert Junior, que estaria completando hoje (08/10) cento e um anos de idade, era um escritor comprometido com a pesquisa detalhada e aprofundada; um autor de sci-fi que resolveu fugir dos temas urbanos, tecnológicos e mais sombrios recorrentes na ficção científica, como o conflito com seres alienígenas, robôs e IA (inteligência artificial), para dar preferência a reflexões sobre os vínculos que unem as pessoas e sua relação com a natureza.

O jovem Frank Herbert.

Lidar com o meio rural foi uma herança dos seus avós paternos, que antes de seu nascimento haviam criado um experimento de uma comuna socialista no estado de Washington, ao norte de Tacoma, nos Estados Unidos. Mesmo não tendo vivido nessa época, toda a experiência e ideologia de trabalhar em grupo com autonomia e ajuda mútua foi incutida na família Herbert e levada à prática na Grande Depressão americana, uma época de aflição econômica para a maioria dos estadunidenses. Mesmo assim, essa foi uma época formidável para o então garoto Frank Herbert, que, juntamente com seus pais Eileen (nascida McCarthy) e Frank Patrick Herbert, desfrutava de uma vida razoavelmente boa na sua fazenda, cultivando uma plantação de milho, criando porcos, galinhas e ordenhando vacas. Essas atividades foram as bases para a formação do seu caráter prático e de seus valores posteriores.

Outro ponto importante era que Frank Herbert tinha nada menos do que seis tios, todos morando na mesma região e fazendo atividades em conjunto, propiciando a ele um contato frequente com seus primos, despertando em Herbert um sentimento de pertencimento e de importância da sua família. Frank também foi muito influenciado por Henry Martin, da tribo Hoh, que “semi-adotou” o menino curioso e hiperativo, lhe ensinando o respeito pela mãe natureza, sendo o início do compromisso vitalício de Frank Herbert com as questões indígenas de seu país.

Aos oito anos, no seu aniversário, Frank Herbert anunciou solenemente à sua família que decidiu ser escritor, que iria tornar-se o contador de histórias oficial dos acampamentos de férias, onde era desafiado por seus amigos a desenvolver e improvisar uma trama, de preferência assustadora.

Aos 18 anos, saiu da casa dos pais alcoólatras com a irmã Patricia Lou para morar com tios em Salem, no estado do Oregon, onde ingressou no ensino médio. Ao finalizar seus estudos, conseguiu um emprego no jornal Glendale Star, mentindo na entrevista sua verdadeira idade. O jornalismo iria lhe possibilitar participar dos bastidores da política norte-americana, aumentando seu conhecimento crítico e desconfiança sobre qualquer forma de poder institucional.

Casou-se aos 20 anos com sua primeira esposa, Flora Parkinson, e separou-se em 1945, embora a filha, Penny Herbert, tenha nascido em fevereiro de 1942. Na época, durante a Segunda Guerra Mundial, Frank Herbert participou brevemente do evento na Marinha como fotógrafo, mas foi dispensado após seis meses de serviço por motivos médicos.

Frank ingressou no curso de Literatura Criativa na Universidade de Washington, em 1946, onde conheceu e se apaixonou por Beverly Ann Stuart, mulher com a qual Herbert se casou no mesmo ano. Beverly foi o amor da vida de Frank; juntos eles tiveram dois filhos: Bruce e Brian Herbert.

Frank e sua esposa, Beverly.

As influências ideológicas que pautaram as bases de Duna são interessantes. Após seis anos de pesquisa e escrita, Duna foi lançado em 1965. A obra-prima de Frank Herbert se integrou ao início de uma nova época para a literatura de ficção científica. Vários autores de sci-fi como Octavia Butler, Roger Zelazny e Ursula K. Le Guin se uniram a Frank Herbert para, em meio ao movimento da chamada Geração Beat, remodelar a Ficção Científica, trazendo reflexões de construção de mundo literário para características da vida real que antes ainda não haviam sido abordados.

O sci-fi então passou a desenvolver pautas como a preocupação com o meio ambiente, a relação dos seres humanos com o avanço da tecnologia, biotecnologia, racismo, xenofobia, machismo e também narrativas com questões sociais sobre ricos e pobres numa sociedade futurista, que viriam a posteriormente fazer surgir o subgênero Cyberpunk.

Em Duna, Frank Herbert foi um pouco mais além para imaginar com detalhes como seriam poderosas instituições políticas e religiosas em um contexto futurista onde o domínio da natureza, conhecimento científico e avanço tecnológico por parte da humanidade fossem concepções muito avançadas.

É claro que uma obra com tamanha vastidão de temas causaria uma grande revolução e inspiraria diversas obras posteriores. Até nesse sentido Duna foi além, servindo de influência não só para a literatura como também cinema e TV, e ultrapassando os limites da ficção científica para também inspirar obras de Fantasia. Star Wars, Exterminador do Futuro, Matrix e As Crônicas de Gelo & Fogo são apenas alguns dos grandes mundos de narrativas que agregam milhões de fãs por todo o mundo e que em níveis variados se espelharam na obra de Frank Herbert.

Pôster da nova adaptação da grande obra de Herbert.

Finalmente, após 56 anos do lançamento original do livro, temos a oportunidade de vermos uma adaptação cinematográfica de Duna, que sob a direção do aclamado cineasta Denis Villeneuve, vem recebendo críticas superpositivas. Segundo Brian Herbert, filho do autor, o filme de Villeneuve se trata de uma adaptação completamente digna.

O lançamento do filme Duna acontecer no mês de aniversário do autor é com certeza algo muito significativo.


Compre os livros de Frank Herbert e conheça o universo de Duna.

*Engenheiro, escritor de Fantasia e Ficção Científica e colunista no Medium, Bruno Birth é co-criador do DunaCast, um podcast voltado ao universo de Duna e que analisa cada um dos capítulos dos livros da Saga Duna.

**O Sociólogo Pascoal Naib é o administrador do Duna Arrakis Brasil, fandom brasileiro que reúne fãs de Duna de todas as gerações, e co-criador do DunaCast, um podcast voltado a análises dos livros da Saga Duna. Fã da obra de Frank Herbert, Pascoal é um apaixonado pelas areias de Arrakis desde a década de 1980, quando conheceu esse universo fantástico ao assistir no cinema o filme de David Lynch.

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